Meu filho Gustavo Bayer, Ator na Companhia do Latão, morreu neste 30 de março de 2024, sendo enterrado no domingo.

 

 

 

       Precisei fazer o elogio fúnebre. Um pai não faz essas coisas. Pouco importa, eu fiz, bem curtinho, chorando. Pouca gente soube da morte, mas Gustavo vinha sofrendo ressumbrante. Eu diria dor em demasia. Era hora de partir. Foi sepultado no mesmo túmulo que guarda os restos de Ana Maria Babette, mãe dele. Era Domingo de Páscoa, dia da ressurreição de Jesus Cristo, data alegre para a cristandade. A  notícia ruim a família deixou para dar na segunda-feira, porque não iria acinzentar o correr da ressurreição. Nós achamos melhor assim. Vamos à missa no domingo que vem, o sétimo dia, rezando comunitariamente na igreja de Santa Terezinha, Rua Maranhão nº 617, em São Paulo, às 18h00. Gustavo Bayer, assim conhecido na Companhia do Latão, era ator de teatro talentosíssimo, moço e bonito. Outro dia eu disse que aos 88 anos podia, sem rebuços, afirmar que um homem era belo. Posso repetir isso, enquanto octogenário, por tal razão e mais ainda, pois Gustavo tinha os traços da Babette, linda também e sepultada ao seu lado. Foi-se um excelente profissional de teatro, mas quem o diz muito melhor que eu é Helena Albergaria, conforme transcrição[1]:

 

       “Gustavo Bayer se foi, ontem. Quem o viu em cena, transbordante, intenso, tomado pela intenção cuidadosa que cerca a grande intuição, sabe que estava diante de um dos maiores artistas de seu tempo. Pouco visto, pouco compreendido, absolutamente inesquecível. Triste esta época de teatro que não conheceu Gustavo. O brilho dos primeiros trabalhos da Companhia do Latão se confunde com o dele. Foi o Danton fascinante e furioso na peça de Buechner, o Bocarra operístico e trágico da Santa Joana de Brecht, o Hamlet que ironizava a si próprio e cantava “Xô xô Barata”, no Ensaio sobre o Latão. Foi os vários nomes tortos do Sujeito, entre outras composições luminosas. Não ensaiava sem pôr em cada gesto e sílaba sua concentração máxima. Alguns se perturbavam com sua independência, seu senso de liberdade radical, seu gosto pelos ritmos musicais, regulares e irregulares, e seu olhar perplexo quando notava que um ator não amava, verdadeiramente, o palco. Tive a sorte de conhecê-lo, de admirá-lo, de aprender e me modificar com ele. Tenho um rombo no coração quando escrevo estas linhas. Falamos há poucos dias, por telefone, sobre o desejo de um trabalho próximo… Procuro fotos antigas, na esperança que contenham algo da beleza que ele trouxe ao mundo”

 

       Ela escreve aquilo que eu não conseguiria escrever. As irmãs, Paula Bajer Fernandes e Georgia Bajer de Freitas Porfirio, estão aqui comigo participando de cada pedaço de dor que Gustavinho sentia no hospital. Dyonne, aos 94 anos, tomou assento na cadeira de rodas e percorreu longo caminho até a lápide. Como todos, gostava muito dele e sabia que estar perto do andor é o caminho da paz. Foi assim. Ainda está sendo assim, nesta terça-feira, noticiando-se a morte de um ótimo ator, de um excelente filho, e de uma criatura bonita, suave, e elegante. No fim das contas, Deus não quis que ele sofresse mais. Bastava como demonstração de poder. Já havia excesso demasiado e fora de qualquer conta de chegança.

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